Justiça autoriza devedor a quitar dívida até assinatura do auto de arrematação
- O Imobiliarista
- 14 de mai.
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Uma recente decisão da Justiça Federal da 3ª Região garantiu a um mutuário do Sistema Financeiro da Habitação o direito de quitar sua dívida — a chamada “purgação da mora” — até o momento da assinatura do auto de arrematação do imóvel, mesmo após a consolidação da propriedade em nome da instituição financeira. O entendimento foi firmado no julgamento de agravo de instrumento pela 1ª Turma do TRF-3, sob relatoria do desembargador federal Herbert de Bruyn.
O caso envolve um contrato firmado em julho de 2016 no âmbito do programa habitacional com garantia de alienação fiduciária. O mutuário alegou não ter sido devidamente intimado para regularizar o débito e buscava, por meio de liminar, suspender os atos expropriatórios promovidos pela instituição financeira credora.
Apesar de o pedido de urgência ter sido inicialmente negado pela 4ª Vara Federal de Campinas, o TRF-3 deu parcial provimento ao recurso, reconhecendo o direito à purgação da mora com base na legislação vigente à época da assinatura do contrato.
“Em atenção ao princípio da segurança jurídica e em respeito ao ato jurídico perfeito, não é o registro da consolidação da propriedade o marco temporal para a aplicação das novas regras da Lei n.º 13.465/2017, mas, sim, a data da celebração do contrato”, afirmou o relator.
Direito adquirido deve ser respeitado
A controvérsia gira em torno da interpretação da Lei n.º 13.465/2017, que restringiu a possibilidade de purgação da mora até a assinatura do auto de arrematação para os contratos de alienação fiduciária. Desde então, a jurisprudência passou a admitir a quitação apenas até o momento da consolidação da propriedade em nome da instituição credora. No entanto, o TRF-3 reafirmou que essas mudanças não podem afetar contratos firmados sob a legislação anterior, especialmente para preservar direitos já consolidados.
“Ao firmarem um contrato, as partes fazem-no à luz do direito então vigente. Assim, se tal direito já existia, uma lei posterior não pode suprimi-lo sem violar o princípio da irretroatividade”, destacou o voto do relator.
A decisão se baseou, inclusive, em precedentes do Supremo Tribunal Federal (STF), que reconhecem a proteção ao ato jurídico perfeito, conforme estabelece o artigo 5º, inciso XXXVI da Constituição Federal.
Notificação pessoal é obrigatória
Outro ponto analisado foi a legalidade da consolidação da propriedade. O relator reconheceu que, de acordo com a Lei n.º 9.514/97, é obrigatória a notificação pessoal do devedor para que ele possa quitar o débito no prazo legal de quinze dias. No caso analisado, a matrícula do imóvel continha certidão afirmando o cumprimento desse trâmite, o que levou a turma a afastar, neste momento, qualquer nulidade na consolidação da propriedade.
Contudo, a alegação de que o devedor não foi informado sobre a data do leilão deverá ser examinada em fase posterior do processo, por exigir produção de provas.
Efeitos da decisão
Com o entendimento firmado, o mutuário terá a oportunidade de quitar a dívida até a assinatura do auto de arrematação — e não apenas até a consolidação da propriedade, como sustentava a instituição financeira com base na nova lei. A decisão, embora parcial, representa um reforço importante aos direitos dos devedores fiduciários que firmaram seus contratos antes de 12 de julho de 2017, data de entrada em vigor da nova legislação.
“A purgação da mora é direito material e, portanto, sua regulamentação não pode ser alterada retroativamente sem comprometer a segurança jurídica”, concluiu o relator.
Panorama legal: o que muda com a Lei n.º 13.465/2017
Antes da Lei n.º 13.465/2017, os contratos de alienação fiduciária de imóveis permitiam ao devedor quitar os débitos até a assinatura do auto de arrematação. Após a nova legislação, o direito à purgação passou a ser restringido, e o devedor passou a ter apenas o direito de preferência na compra do imóvel já consolidado em nome da instituição financeira — mediante o pagamento do valor da dívida e encargos.
A decisão do TRF-3, no entanto, reafirma que essa mudança só se aplica a contratos firmados após a vigência da nova norma, resguardando os contratos antigos sob as regras anteriores.
Jurisprudência em formação
O voto do desembargador Herbert de Bruyn também menciona adesão ao entendimento do colega Nelton dos Santos, no julgamento de um agravo semelhante, o que sinaliza um caminho de unificação da jurisprudência na 3ª Região.
“Para evitar-se a irretroatividade da lei, a única solução aceitável é aplicar-se a lei vigente ao tempo da celebração do contrato”, sustentou o acórdão citado.
Baixe a decisão: https://shre.ink/eX2p
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